Resenha: Turborider – Reckless Love

ilustração de uma mulher jovem montada em uma bicicleta cheia de neon em um ambiente urbano noturno e altamente iluminado com neon e luzes dos anos 1980. o logo da banda aparece no canto superior esquerdo e o nome do disco vem ao longo do rodapé

Reprodução da capa do álbum (© AFM Records)

Depois de uma década aumentando a dose de pop já naturalmente contida no glam metal, o quarteto finlandês Reckless Love se entregou de vez aos sons eletrônicos e mergulhou fundo nos anos 1980, criando o disco que para eles equivale ao Affinity do Haken ou o Extreme Power Metal do DragonForce (clique aqui e aqui, respectivamente, para conferir minhas resenhas sobre os mesmos). Perfeito para ir se preparando para a quarta temporada de Stranger Things.

O verso “more electric than before” (“mais elétrico do que antes”, em tradução livre) da faixa título e de abertura, resume bem o tom da obra. Mas a melhor parte, e justamente o fator responsável por não tornar Turborider um fiasco completo, é que as guitarras não foram relegadas a um segundo plano, tampouco tiveram seu som atenuado. E essa mistura gostosa de guitarras “sérias” com tecladinhos oitentistas é o que torna o álbum bem notável.

Curiosamente, a única música que manteve certa distância dessa roupagem toda (exceto pela bateria) foi o cover de “Bark at the Moon”, clássico oitentista de Ozzy Osbourne. Não chega a ser um cover, mas o prelúdio “Fight of the Cobra” homenageia a lenda “Eruption” do Van Halen antes de dar espaço a “Like a Cobra” – canção um tanto decepcionante por não entregar a agressividade que o prelúdio e o título sugeriam.

Se na resenha do lançamento anterior InVader (clique aqui para conferi-la) eu disse que trazer mais pop para o som era um movimento perigoso “num mundo cheio de fãs 666 from hell avessos a mudanças”, agora eu já digo que eles estão é certos em mergulhar nessa “bagunça calculada”. É como se a banda, mesmo que sob o risco de perder seguidores, “saísse do armário” e abraçasse com gosto aquilo que ela é. E o que ela é? Só ouvindo para descobrir.

Avaliação: 4/5.

Abaixo, o clipe da faixa-título:

Resenha: Troika – D’Virgilio, Morse & Jennings

imagem imitando um arquivo ou pasta e com o sobrenome dos três integrantes listados; o nome do disco vem cruzado de modo que as letras "r", "o" e "i" se cruzem com as mesmas letras nos três nomes. Fotos dos três integrantes aparecem no canto superior direito

Reprodução da capa do álbum (© Inside Out Music)

O tédio da quarentena tem encorajado músicos ao redor do mundo a apostarem nas coisas mais loucas. Agora o vocalista/tecladista/violonista estadunidense Neal Morse (NMB, Tansatlantic, Flying Colors, ex-Spock’s Beard) resolveu chamar seu ex-colega de Spock’s Beard, o vocalista/baterista Nick D’Virgilio (também do Big Big Train) e a lenda em ascensão Ross Jennings (Haken, Novena) para criar um álbum de canções acústicas com harmonizações vocais.

Ainda bem que o trio tratou de jogar água no chopp de quem achava que teríamos uma espécie de “Spock’s Beard vs. Haken”. Não, não, este disco de estreia deles (batizado de forma um tanto megalomaníaca como Troika) tem bem pouco de progressivo.

Sim, os teclados e guitarras marcam presença e os três não resistem em mandar uns momentos mais sofisticados (por exemplo, a versão completa de “Julia” vem como faixa bônus e supera os 8 minutos). Mas o grande “quê” aqui é a harmonização vocal dos três, sustentada principalmente por violões e percussão simples. Tinha tudo para ser um saco, mas até que deu certo.

Quer dizer, a combinação das três vozes realmente agrada, e os caras souberam tirar proveito disso até o limite que o projeto admitia. As composições em si, entretanto, poderiam ter sido mais memoráveis. Mesmo após algumas ouvidas, eu continuava sem gravar praticamente nenhum momento de Troika na memória.

Exceções são “If I Could”, com a providencial participação do lendário baixista Tony Levin; as surpreendentes “Second Hand Sons” e “My Guardian”, que jogam a lógica “folk acústico” pela janela e vêm com um rock que nossos ouvidos já não estavam mais esperando a esta altura do trabalho (elas estão na reta final); e o emocionante encerramento “What You Leave Behind”, provavelmente a única melodia que você se pegará cantarolando após um play na obra.

Talvez a proposta do trio funcione um pouco melhor ao vivo, quando a entrega pode ser mais intimista e livre, mas em se tratando de três lendas vivas que conquistaram aclamação de público e crítica em suas carreiras pregressas, não é difícil imaginar que um segundo lançamento venha com mais força que este.

Avaliação: 3/5.

Abaixo, o clipe de “Everything I Am”:

Resenha: Churches – LP

foto de LP em posição de oração com um pássaro vermelho pousado nas mãos ante um fundo escuro.

Reprodução da capa do álbum (© SOTA Records/Dive Alone Records)

A cantora estadunidense LP abre “My Body”, sétima faixa de seu sexto disco de estúdio (objeto desta resenha), com a frase: “Começar de novo, do punk rock à Bossa Nova”. Eu quase digo que ela não estava apenas sendo poética.

Porque uma das razões pelas quais Churches é um dos melhores lançamentos de 2021 é justamente a diversidade de gêneros através da qual suas impressionantes 15 canções passeiam.

A força da abertura “When We Touch” dá o tom deste álbum, mantido na sua sucessora, o single “Goodbye”. “Everybody’s Falling in Love” é só a terceira, mas já surpreende com sua mistura de ukulele com batidas eletrônicas.

“The One That You Love” vem em seguida com outra guinada, agora para o country/southern rock. Essa abordagem meio interiorana continua na seguinte, “Rainbow”, majoritariamente fincada no violão da cantora, e mais tarde em “How Low Can You Go”, cujo clipe filmado no México dá o tom desértico e misterioso da canção. A fusão mexicana volta ainda na boa “Can’t Let You Leave”.

“Conversation” e “Safe Here” adotam uma vibe levemente soturna e urbana, molhando os pezinhos no Coldplay das antigas. E antes de encerrarmos com a autodescritiva “Poem”, deliciamo-nos com a faixa título, uma crítica a religiões disfarçada de declaração de amor que faz dela praticamente a “Take Me to Church” de LP.

O que garante que essa salada musical soe coesa? A incrível voz de LP, que para nosso deleite não se contentou em fazer carreira apenas escrevendo material para os outros (pra quem não sabe, ela assina canções de gente do naipe de Cher, Rihanna, Backstreet Boys e Céline Dion). O som que sai da sua garganta é outro fator que ajuda Churches a ser um discão da porra.

E temos ainda a parte mais importante do catálogo da cantora: a emoção e sinceridade que ela imprime na música que faz. Seja adotando tons festivos e seguros ou melancólicos e vulneráveis, tudo parece ser sempre feito de peito aberto e sem máscaras. Exceto as contra COVID, por favor.

Avaliação: 5/5.

Abaixo, o clipe de “Goodbye”: