Resenha: Music of the Spheres – Coldplay

Reprodução da capa do álbum, trata-se da ilustração de um sistema solar dentro de vários círculos circunscritos. O nome do disco, da banda e alguns símbolos aparecem na lateral esquerda, escritos de lado

Reprodução da capa do álbum (© Parlophone)

Parece que o quarteto inglês Coldplay gosta de mexer com as emoções dos críticos. Depois de um disco ok (A Head Full of Dreams; clique aqui para conferir minha resenha a respeito), que sinalizava um mergulho definitivo no pop; e de um álbum ótimo (Everyday Life; clique aqui para conferir minha resenha a respeito), em que eles davam a volta por cima e mostravam que uma banda deixar de ser rock não precisa ser necessariamente algo ruim; chegou a hora de eles chafurdarem de vez da forma mais musicalmente baixa possível. E o que é pior: desperdiçando um conceito dos mais interessantes.

Inclusive, a coisa mais interessante em Music of the Spheres – nono trabalho de estúdio deles – como um todo é justamente a sua premissa: criar um “sistema solar” de músicas, em que cada canção representa um planeta, lua, estrela e até uma nebulosa. Parece ideia saída da mente de um músico de rock progressivo, mas os rapazes tentaram mostrar que o pop também pode ser sofisticado (e engana-se redondamente quem acha que não pode).

Tão sofisticado que a obra já era sutilmente divulgada em lançamentos anteriores, criando um hype para algo que no fim não ficou a altura no esperado. Talvez os fãs mais recentes tenham ficado satisfeitos, mas eu que não me contento com um mar de modismos sintéticos que praticamente inutilizam os três instrumentistas que acompanham (e cada vez mais só acompanham mesmo) o vocalista/pianista Chris Martin.

Music of the Spheres vê o Coldplay se entregar de vez ao pop da maneira menos digna possível. Como manda o manual, chamaram um exército de produtores para conceber cada faixa, e o trabalho a várias mãos resulta em peças risivelmente menos interessantes que seus clássicos de início de carreira, compostos de forma bem menos colaborativa.

A dependência que eles criaram com o topo das paradas é tão forte que vale até fazer parceria com o BTS, os reis daquela praga denominada K-pop. Ou com Selena Gomez, que não faz nada para tornar a canção em que participa (“Let Somebody Go”) mais do que trivial.

Fazendo um esforço muito grande como fã da banda, eu elenco três canções como verdadeiramente interessantes: “♥”, em que eles atacam a cappella com We Are King e Jacob Collier; “People of the Pride”, o único momento mais ou menos rock do disco (fora a versão acústica de “Higher Power”, lançada como faixa bônus ao lado de um remix da mesma por Tiësto); e “Coloratura”, a peça mais longa da história deles, que leva um tempo para ser digerida mas se mostra uma jornada que justifica o seu tamanho.

Nesta montanha-russa que virou a discografia do Coldplay, vou concluir esta resenha de modo “realista”. Nem pessimista demais para dizer que o mergulho no pop genérico não tem mais volta, nem otimista demais para dizer que eles voltarão com outro Everyday Life no próximo lançamento.

Avaliação: 1/5.

Abaixo, o clipe de “Higher Power”:

Resenha: Everyday Life – Coldplay

Reprodução da capa do álbum (© Parlophone)

Ao avaliar A Head Full of Dreams (2015), sétimo trabalho de estúdio do quarteto inglês Coldplay, eu disse que o caminho que eles haviam seguido musicalmente era sem volta. Mas parece que me enganei. É o que se conclui após ouvir Everyday Life, sucessor do disco supracitado e objeto desta resenha.

Dado à luz após uma campanha que envolveu cartazes em cidades pelo mundo todo e cartas batidas à maquina de escrever, o oitavo lançamento de estúdio deste que é um dos nomes mais populares do mundo é duplo e vem dividido em “Sunrise” e “Sunset” – respectivamente, nascer e pôr do sol.

E por que me enganei? Porque a banda mostrou total disposição para retornar a um som mais encorpado e maduro. Mesmo assim, eu reluto em chamá-lo de “volta às raízes”, como alguns vêm fazendo. Este trabalho tem incursões demais em terrenos novos ou mais ligados ao som recente deles para ser comparado apenas ao início da carreira dos caras.

Por exemplo, “Broken” é um gospel puro e simples e o encerramento do primeiro disco, “When I Need a Friend”, também tem um clima bem religioso, só que desta vez com mais destaque para as vozes que acompanham o vocalista Chris Martin. E temos ainda “WOTW / POTP”, com qualidade propositalmente abaixo do normal para indicar algo rústico e, por que não, improvisado.

“Daddy” poderia ter sido lançada no horroroso Ghost Stories (clique aqui para conferir minha resenha a respeito) por sua grande leveza, com a diferença de que é uma leveza do tipo bom, e não do tipo “fomos convidados a tocar na cerimônia de abertura da Copa do Mundo de Sono” como foi o caso do álbum supramencionado.

“Arabesque” é de uma finesse grande até para o padrão do grupo, mostrando-se efetivamente uma das músicas do ano, pela surpresa, pela riqueza, pelo bom gosto, enfim. Chama a atenção especificamente o ritmo marchante, o baixo pulsante e muito vivo e os providenciais metais, que vêm com um toque de Jerry Martin que nos remete à trilha sonora do jogo SimCity 4.

Já as ligações com o passado recente vêm, por exemplo, na serena e sintética “Church”, que contrasta com a belíssima e puramente acústica abertura “Sunrise”, levada só nas cordas.

Ou então em “Guns”, que lembra “Major Minus” de Mylo Xyloto (clique aqui para conferir minha resenha a respeito). Essa conexão com o passado contrasta com o ineditismo de conter mais palavrões por m² que toda a discografia pregressa deles.

Outras canções dignas de nota incluem a boba alegre “Cry Cry Cry” e o quase instrumental “Bani Adam” que desemboca no destaque já mencionado “Champion of the World”. Separando os discos, temos um interlúdio de sinos de igrejas que, por algum motivo, veio separado em seis faixas curtíssimas.

Repetindo uma tradição recente, Everyday Life tem diversas participações especiais, mas de músicos bem menos conhecidos que as figurinhas pop com quem o Codlplay estava flertando. Trata-se de um seleto grupo de profissionais de diversos locais do mundo (principalmente de países muçulmanos).

Já faz um tempo que ressalto o fato do Coldplay não ser mais rock. Essa máxima continua válida aqui, mas não digo isso mais de forma pejorativa como antes. Agora, eu digo isso pelo simples motivo de que eles atingiram algo superior a categorizações.

Se eu finalizei a resenha de A Head Full of Dreams dizendo que ele nos dava “uma luz no fim do túnel quanto ao futuro da banda”, posso finalizar esta dizendo que a tal luz não desapontou.

Nota = 5/5.

Abaixo, o lyric de “Arabesque”:

Resenha: A Head Full of Dreams – Coldplay

Breve histórico: O quarteto britânico Coldplay lota estádios e estoura nas rádios, mas um grande número de pessoas torce o nariz para a maneira como trocaram um certo rock alternativo por algo não muito distante do pop. Fato é que já cravaram seu nome na história da música e são donos de um som que poucos se atreveriam a tentar copiar.

Reprodução da capa do álbum (© Parlophone)

Reprodução da capa do álbum (© Parlophone)

1,5 ano após lançar Ghost Stories, o fundo do poço de sua carreira (e resenhado neste blog), o Coldplay tinha a difícil missão de mostrar que não queria mais ser uma banda de música de elevador. Alguns diriam que recuperar a admiração dos fãs de rock também era uma missão, mas isso claramente não é mais um objetivo. Em primeiro lugar, porque o caminho que seguiram não tem volta. Ainda, se mesmo lançando uma compilação de canções de ninar eles continuam com estrondoso sucesso, por que voltar às raízes?

Que fique claro, houve sim uma mudança em A Head Full of Dreams: toda a positividade que marcou Mylo Xyloto, por exemplo (também resenhado aqui), está de volta. Se a faixa título e de abertura, juntamente a sua sucessora “Bird” e o single “Adventure of a Lifetime”, ditam uma tônica alegre, “Everglow” e “Amazing Day” já vão por um caminho mais lento e meloso. A densidade e o ritmo de “Army of One” lembram o sucesso “Paradise”, contrastando com sua sonolenta faixa escondida “X Marks the Spot”. O que não mudou foi a tendência do grupo a se distanciar do chamado “piano rock”.

Mantendo a tradição recente das parcerias, muitos nomes interessantes aparecem aqui. A participação de Beyoncé em “Hymn for the Weekend” levará os rockistas à loucura, mas é inofensiva se levarmos em conta o padrão musical que o Coldplay vem apresentando. Na verdade, ela é a única vocalista cujos talentos foram realmente aproveitados.

A sueca Tove Lo, bem como a estadunidense Merry Clayton, ficam restritas aos vocais de apoio. Barack Obama só emprestou partes de uma cantoria realizada durante um funeral para “Kaleidoscope”, algo muito menor do que o alarde na imprensa poderia sugerir – a narração do poeta estadunidense Coleman Barks e o piano da georgiana Khatia Buniatishvili deixam marcas maiores em nossos ouvidos. Dó mesmo a gente tem que ter da atriz e cantora Gwyneth Paltrow, ex-esposa do vocalista, pianista e violonista Chris Martin: limitou-se a três ou quatro “hey-hey”s em “Everglow”. Até a estrela do ex-Oasis Noel Gallagher brilha em “Up&Up”, mas você não ficará sabendo disso até consultar o encarte.

Fechando a lista de faixas, temos ainda o interlúdio “Colour Spectrum”, a balada motivacional “Up&Up” e, como faixa bônus, o single “Miracles”, lançado em dezembro de 2014 e parte da trilha do filme Invencível.

Dizer que o Coldplay não é mais rock a esta altura é chutar cachorro morto. Aliás, abandonar o rock não é nenhum crime hediondo como muitos consideram. O Coldplay nunca conquistou pelas guitarras, e sim pelo clima positivo de suas músicas, e é por isso que Ghost Stories foi tão decepcionante. E se este sexto disco do grupo não traz nenhum momento memorável dentro da densa discografia do quarteto, ele também não deixará os fãs em geral na mão.

Por outro lado, fica a pergunta: ainda é útil funcionar como quarteto em estúdio? O que o baterista Will Champion e o baixista Guy Berryman fazem que um computador não poderia fazer? Jonny Buckland e sua guitarra ainda conseguem marcar território, fazendo mais ou menos o que o japonês Tak Matsumoto fazia nos primeiros álbuns do B’z.

Nota = 7/10. Depois daquele susto em 2014, o Coldplay volta a fazer música que não faz o fã correr o risco de dormir ao volante. Sem nenhum tempero especial e esbanjando participações que raramente oferecem algo além dos próprios nomes, A Head Full of Dreams ao menos cumpre com sua obrigação de ser mais um item de estimação do fã e nos dá uma luz no fim do túnel quanto ao futuro da banda.

Abaixo, o vídeo de “Adventure of a Lifetime”: