Resenha: Renegades – Equilibrium

Reprodução da capa do álbum (© Nuclear Blast Records)

Foi com bastante ceticismo e ressentimento que a comunidade de fãs do sexteto alemão Equilibrium recebeu os primeiros singles do sexto disco de estúdio deles, Renegades.

Pudera, logo de cara, sem anestesia, a banda mandou uma faixa (“Path of Destiny”) quase totalmente desprovida dos elementos folclóricos e sinfônicos que consistiam em seus diferenciais; marcada por inéditos vocais limpos; e que ainda por cima trazia a participação especial do grupo de rapcore The Butcher Sisters. Tem fã que deve estar em coma até agora.

A má notícia é que o folk foi assumidamente chutado para escanteio e substituído por algo próximo do new metal, numa tentativa deliberada de se modernizar o som, nas palavras do guitarrista e líder René Berthiaume. E o álbum tem alguns problemas pontuais que discutirei mais abaixo. A boa notícia é que eles ainda são bons – eu, pelo menos, ainda compraria um ingresso para assisti-los ao vivo.

A jornada começa com a poderosa “Renegades – A Lost Generation”, cujo riff deixa claro que a banda está, definitivamente, de olho em outros estilos que não sejam o folk ou o black metal. Eu diria que foi um claríssimo cartão de visitas para esta nova fase.

Exceto pelo fato de que é na sequência “Tornado” que temos outra novidade relevante desta nova fase do Equilibrium: os supramencionados vocais limpos, alternados com os tradicionais guturais. Cortesia do baixista Martin “Skar” Berger, um dos membros estreantes aqui.

“Himmel und Feuer” é um dos destaques. Por quê? É a única totalmente na língua materna deles; evolui a partir dum riff que parece ter saído dum lançamento qualquer de pop punk; brinca com compassos não-ortodoxos; e é toda cantada em gutural.

Sobre a já mencionada “Path of Destiny”, só acrescento que a adoção de rap no heavy metal pode funcionar muito bem, a despeito dos chiliques dos insuportáveis “puro sangue”, mas neste caso a decisão foi simplesmente nada a ver e o trecho sobra no meio da canção.

“Kawaakari – The Periphery of the Mind” surpreende mais uma vez, desta vez com riffs que liberam um leve aroma metalcore. E as definições de “aleatório” são novamente atualizadas no cover inesperado de “Johnny B”, do The Hooters. E tirando a participação da cantora Julie Even, cujo timbre é assustadoramente parecido com o da nossa Zélia Duncan, “Hype Train” não acrescenta muito ao disco.

Apesar de tudo que estou dizendo, é fato que Renegades ainda reserva algumas homenagens às origens dos rapazes (e rapariga). Falo de “Moonlight”, menos impactada pela adoção de toques moderninhos e enriquecida com uma (agora rara) flauta; “Final Tear”, a que melhor se aproxima do passado, mas sem demonstrar muita intimidade com o mesmo (embora eu aplauda a aparente tentativa de fazer uma continuação para a magnífica “Eternal Destination”, do disco anterior (clique aqui para ver minha resenha sobre ele)); e o encerramento “Rise of the Phoenix”, cujo conteúdo pouco inspirado não faz jus ao nome e à duração.

Outra nova adição à banda é a tecladista Skadi Rosehurst, cuja entrada fez do grupo um sexteto e fez os fãs esperarem que os elementos folclóricos e sinfônicos ganhassem um destaque sem precedentes. Mas o que aconteceu foi justamente o inverso. Tímida, sua participação fica limitada a alguns panos de fundo e um punhado de riffs moderninhos – nada muito superior ao que já era feito antes, sem um membro exclusivo para isso.

Não vou abrir espaço para a eterna discussão “manter a fórmula vs. mudar”, até porque não existe resposta fixa para isso. No caso do Equilibrium, a decisão foi simplesmente errada, pois eles estão abrindo mão daquilo que os consolidou – e o fazem de maneira tão abrupta que soa artificial. A escapatória deles, no caso, foi que mesmo se aventurando num novo estilo, eles foram felizes e entregaram um bom trabalho. Pesando as duas coisas numa balança, ele pende levemente para o lado positivo. E o tempo dirá se a guinada sonora valeu a pena.

Nota: 3/5

Abaixo, o vídeo de “Path of Destiny”:

Resenha: Immortalis – sukekiyo

Breve histórico: sukekiyo é o projeto solo do cantor Kyo, vocalista do Dir en grey, uma das mais famosas bandas japonesas. Conta com dois ex-membros do Rentrer en Soi: Takumi (guitarra/piano) e Mika (bateria). Completam a formação o guitarrista Uta (ex-9Goats Black Out) e o baixista Yuchi (Kannivalism).

Reprodução da capa do álbum (© Firewall div.)

Reprodução da capa do álbum (© Firewall div.)

Talvez o membro mais popular do quinteto japonês, Kyo não é bem aquele frontman simpático e alegre que sai pulando e sorrindo pelo palco. Até pouco tempo atrás, os shows da banda eram marcados por seus atos de automutilação. Maquiagem corporal simulando queimaduras e esqueletos também não eram incomuns. Hoje, suas performances são um pouco mais leves, mas nem por isso menos sombrias.

Era de se esperar, portanto, que um lançamento solo de Kyo fosse um trabalho de bastante personalidade. Quem é fã de Dir en grey certamente simpatizará com Immortalis, primeiro lançamento solo do sukekiyo. O som é bastante influenciado pelos últimos dois álbuns da banda principal do vocalista: sombrio, melancólico e “deprê”. Mas sem muito peso – as guitarras, tímidas, não demonstram agressividade na maior parte das faixas. É como se Kyo, que já lançou livros de poesia, quisesse apenas criar uma atmosfera sonora para suas sempre criativas letras.

Uma atmosfera bem difícil de se classificar, diga-se de passagem, tal como é o som do Dir en grey. Para esses momentos de dificuldade, sobram sempre os rótulos fáceis como “rock/metal alternativo”.

Mas há algumas músicas mais “encorpadas” também. “Latour”, “Nine Melted Fiction” e “Hidden One” são exemplos. O time de instrumentistas, desconhecido para quem acompanha só de longe a cena japonesa do rock/metal, demonstrou competência e técnica para dar sustentação sonora à proposta do vocalista. São linhas “sérias”, sombrias, misteriosas.

Mas não foi apenas nas letras que Kyo demonstrou capacidade aqui. Quem acompanha o Dir en grey sabe bem que Kyo é um sujeito tecnicamente habilidoso. Do gutural aos agudos, passando por sussurros tenebrosos, gritos agoniantes e rosnados raivosos, o japonês aproveita o espaço que é só seu para mostrar por que tem tantos fãs por aí.

Nota: 8. Não chega a ser uma obra prima da música nipônica, mas sem sombra de dúvidas um trabalho bastante pessoal e marcante. É a primeira vez que um membro do Dir en grey se aventura num projeto solo, e se alguém tinha alguma dúvida da eficácia desta manobra, Kyo acaba de saná-la. Qualquer tentativa de se criar um segundo disco do sukekiyo será bem-vinda agora que já sabemos que o projeto tem brilho próprio.

Aqui, o vídeo de “Aftermath”, não disponível no YouTube.

Resenha: “Omertá” surpreende logo de cara, algo difícil no metal atual

Breve histórico: Adrenaline Mob é um supergrupo de heavy metal fundado pelo baterista Mike Portnoy (ex-Dream Theater), o vocalista Russell Allen (Symphony X, Star One) e o guitarrista Mike Orlando (Bumblefoot, Zakk Wylde). Foram brevemente complementados pelo baixista Paul DiLeo e pelo segundo guitarrista Rich Ward, mas ambos acabaram saindo antes do lançamento do primeiro álbum, Omertá. Apenas o baixista foi substituído – John Moyer (Disturbed) assumiu as quatro cordas há um mês.

Reprodução da capa do álbum (© ESL Music)

Adrenaline Mob é diferente daquilo que os seus integrantes fizeram em suas (vastas) carreiras. E é isso que torna o projeto interessante – ninguém estava esperando por uma sonoridade como essa quando a banda começou a ser anunciada. Até porque seus membros fundadores são conhecidos por fazer um som um pouco mais limpo, ainda que igualmente pesado. Omertá, disco de estreia do quarteto — originalmente quinteto — mescla metal alternativo, industrial, progressivo e tem até alguns toques de thrash e nu metal.

Difícil dizer qual dos músicos está se destacando mais aqui, mas a voz poderosíssima de Russell talvez seja a primeira coisa a chamar a atenção do ouvinte, mesmo para quem já acompanha seu trabalho no Symphony X. Os riffs fortes e marcantes de Mike Orlando, aliados às batidas firmes de Mike Portnoy ditam o ritmo do álbum. Além dos riffs, Mike Orlando trouxe solos bastante técnicos e interessantes, que dão certa solidez ao trabalho. Outra característica notória desta obra é soar constante, sem grandes mudanças entre uma faixa e outra, e mesmo assim não enjoar.

Basicamente, Omertá pode ser dividido entre séries de faixas destruidoras, das quais destacam-se “Undaunted”, “Hit the Wall”, “Feelin’ Me” e “Down to the Floor” e alguns “respiros” posicionados entre elas: “All on the Line” e “Angel Sky”, duas belas baladas, e “Come Undone”, cover do Duran Duran, que conta com a participação da vocalista Lzzy Hale, dona de uma bela voz. O curioso da faixa é que Lzzy parece cantar com mais agressividade que Russell, que limitou-se a cantar versos de maneira mais “limpa”, ainda que com notável emoção.

Nota = 8,0. Surpreende logo na primeira escutada, logo na primeira faixa, algo raro nos lançamentos de heavy metal atualmente, o que torna este álbum uma obra que entraria facilmente numa lista de “melhores de 2012”. Já foi dito, mas não custa repetir: não espere um “Dream Theater encontra Symphony X” com este álbum só porque membros das duas bandas estão aí. Espere algo menos ambicioso, mas igualmente primoroso.

Abaixo, o vídeo da faixa de abertura, “Undaunted”: